Comando-Geral da BM indiciou oito policiais por invasão de residência e ameaça a um preso em Santa Maria para "confessar" assassinato do jovem Gabriel Cavalheiro (foto divulgação) |
O Comando-Geral da Brigada Militar indiciou oito PMs por invadir uma residência em Santa Maria e e ameaçar um homem de 59 anos a confessar o assassinato de Gabriel Marques Cavalheiro, ocorrido em agosto deste ano. O fato aconteceu na noite de sábado, 3 de setembro, quando os policiais prenderam Elton Luis Rossato Gabi, 59 anos, que inicialmente, "confessou" sob coação ter matado Gabriel Marques Cavalheiro, 18 anos, mas que depois a história provou-se ser falsa.
A informação foi dada pela RBS TV nesta quinta (29), pelo jornalista Vítor Rosa, que teve acesso ao documento da investigação da Corregedoria da BM. Foram indiciados o 1º tenente Luiz Antônio Ribeiro Alves, o segundo sargento Carlos Nataniel Castro Racki, e os soldados Luciano Alonso Scherer, Elisangela da Silveira Morales de Oliveira, Rodolfo Tonetto de Oliveira, Antônio Rafael Coelho Lopes, Pedro Vicente Armanini Rosa e Édipo dos Santos Henrique.
O inquérito policial militar foi aberto em setembro deste ano para apurar o caso. A investigação chegou ao fim em novembro. Na quarta-feira (28), o comandante-geral da BM, Claudio Feoli, decidiu pelos indiciamentos. O documento tem 16 páginas e conta com depoimentos dos policiais do caso e do homem preso que, depois, denunciou ter sido torturado.
O comandante-geral da BM afirma que a forma como os policiais conduziram o interrogatório não encontra respaldo legal e que os policiais violaram direitos fundamentais previstos na Constituição. Os oito PMs foram indiciados por dois artigos da lei de abuso de autoridade, que citam o constrangimento ao preso mediante ameaça e a invasão da casa sem determinação judicial.
A Brigada Militar decidiu pela abertura de conselho de justificação contra o tenente e conselho de disciplina contra o sargento e os outros seis soldados. O procedimento pode resultar na exclusão dos policiais. Nenhum dos policiais ou seus representantes se manifestou até o momento.
Conclusão do inquérito
A investigação concluiu que não havia provas de tortura ou de agressões, mas aponta ilegalidades na conduta dos policiais, que ficaram duas horas e meia dentro da casa interrogando o suspeito. Feoli analisou vídeos da abordagem, feitos pelos próprios policiais, e que foram incluídos na investigação. Essas imagens foram entregues, segundo ele, fracionadas e, portanto, não mostram toda a ação.
Em um dos pontos, o coronel afirma que um dos policiais abordou o homem dizendo para ele responder as perguntas sobre a morte de Gabriel "conforme o acordo que eles tinham".
Em outro trecho, um policial teria dito que sabia que o homem era capaz de ter matado Gabriel. Um dos PMs ainda diz que seus colegas presos têm filhos pequenos que vão morrer de fome. Além disso, segundo o inquérito, seguem em defesa dos três presos do caso de São Gabriel, fazendo perguntas direcionadas a autoincriminação do interrogado.
O homem, em um dos vídeos juntados à investigação, pede para levar um tiro para parar o interrogatório, devido ao constrangimento e incômodo sofrido durante a ação, onde o inquérito relata "estado de agitação, desespero e medo" do interrogado.
No inquérito policial, os PMs tiveram diversas justificativas, que variavam de negar as agressões, que Elton teria sido "orientado no presídio" para isso e um deles afirmou que o preso tinha afirmado ter "matado Gabriel e que os policiais militares presos nada tinham a ver", o que se comprovou ser mentira depois pela confissão de Elton que foi coagido e agredido pelos policiais.
Prisão
Elton foi preso em 3 de setembro após confessar ter matado Gabriel. De acordo com a ocorrência policial feita no dia anterior à prisão, a BM procurou o homem após receber uma informação do setor de inteligência de que ele teria comentado com outra pessoa ser responsável pelo crime.
Ainda segundo o registro, os policiais militares prenderam Elton em frente a sua casa, no bairro Noal, em Santa Maria. A polícia não informou por qual crime ele estava foragido.
Elton então afirmou ter sido contratado para matar Gabriel por R$ 15 mil. Disse aos policiais que recebeu um aviso de que o jovem estaria na localidade de Lava Pé, em São Gabriel. Contou que foi ao local, matou Gabriel usando o cabo de um machado e usou seu carro para deixar o corpo no açude, onde o jovem foi encontrado.
No dia seguinte à prisão, em depoimento à polícia, Elton negou ter cometido o crime e disse que foi coagido por PMs.
RELEMBRE O CASO
Na noite de 12 de agosto, Gabriel Marques Cavalheiro, 18 anos, tinha se perdido da casa de seu tio no Bairro Independência, onde estava residindo para realizar exames de admissão ao Exército na semana seguinte. Próximo da meia-noite, ele chegou na casa de uma vizinha na rua Sete de Setembro, que acionou a Brigada Militar porque segundo ela, ele queria forçar a entrada no local.
Os policiais militares chegaram ao local, algemaram e teriam agredido Gabriel, que foi imobilizado e levado para dentro de uma viatura da BM. Testemunhas afirmaram que ele foi atingido por "pelo menos dois ou três golpes de cassetete" e foi a última vez que ele foi visto com vida.
O tio dele deu falta no dia seguinte e informou a família, que iniciou as buscas e ao chegar junto à Brigada Militar, a corporação negou inicialmente e depois, corrigiram a informação, onde afirmaram que o jovem foi levado até o Lavapé, a 2 km de onde ele foi abordado, "a pedido dele".
As buscas foram feitas na região durante cinco dias e concentradas em um açude, até que no final da tarde de 19 de agosto, o corpo foi localizado submerso nas águas. Os três policiais foram imediatamente presos, após comoção popular e continuam detidos no Presídio Militar de Porto Alegre.
Os três policiais prestaram depoimentos em três ocasiões, sendo duas vezes para a BM e uma para a Polícia Civil. Em todas, eles negaram envolvimento no assassinato de Gabriel. Os laudos apontaram que Gabriel morreu vítima de hemorragia interna, causado por ação de "instrumento contundente" e os policiais foram indiciados no inquérito militar por homicídio qualificado, ocultação de cadáver e falsidade ideológica. Em 1º de setembro, a Polícia Civil indiciou os suspeitos por homicídio doloso triplamente qualificado.
As audiências já estão ocorrendo na Justiça comum. Está prevista mais uma para 24 de janeiro, após o retorno do recesso do Judiciário.
Reportagem: Marcelo Ribeiro
Data: 29/12/2022 XXhXX
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