João Nunes Junior
Advogado e leitor do blog
Acreditei, por bom tempo, que fosse a distância um episódio meramente geográfico. Por este motivo, achava que toda saudade por ela inventada era frágil justamente pela possibilidade iminente de acabar, de repente, por um encontro. No último ano, contudo, percebi que a distância pode, também, ser um fenômeno grave e temporal, capaz de criar, a partir de si, uma saudade crônica e sem cura.
Existe, hoje, dois de março de 2015, a distância de um ano entre o meu corpo, sentado diante do computador, inventando este texto enquanto, atrás da janela, o sol inventa o dia, e a última vez que vi a presença corpórea de meu pai. Existe, pois, uma distância de mais de um ano entre as ruas de São Gabriel e a sua presença carismática em frente ao escritório, com sorrisos gratuitos disponíveis a quem quer que fosse. Há uma distância intransponível entre o seu corpo abstrato e o carinho quente que ele oferecia para os que nele buscavam colher um pouco de paz. Há, dentro dos que por ele mantinham amor ou afeto, uma saudade que devora pensamentos e crava os dentes na alma, fazendo nascer - nela, não no corpo - uma dor silenciosa, que não se cansa, fruto de uma distância que não descansa e cresce a cada instante: uma distância infinita que, entretanto, se vista a olho nu, na sua face geográfica, sequer existe, pois a morte esconde a presença que retira do corpo sem vida dentro dos corpos daqueles que sabem educar o amor.
Dentro de mim, meu pai persiste. Hoje amanhecemos juntos. Juntos enganamos a distância e reparamos no azul-turvo do dia. Ele me contou que mora agora dentro de um abraço.
(Em homenagem ao Doutor João Deoseno dos Santos Nunes)