Quando possível traremos uma opinião dos leitores do blog. Hoje, traremos a opinião do Delegado de Polícia de Tramandaí (RS), Roger Spode Brutti, sobre um tema polêmico, que é a Pedofilia. Se você quiser escrever sobre qualquer assunto de seu domínio, entre em contato com a gente.
Roger Spode Brutti
Delegado de Polícia*
Dizem que uma inverdade proferida mil vezes torna-se uma verdade. E é exatamente isso o que vem ocorrendo com o termo “pedofilia”, ocasião em que este está sendo utilizado como sinônimo de crime.
É bem verdade que a pedofilia motiva, naturalmente, uma grande perturbação moral na sociedade, em decorrência da indignação, aversão ou repulsa que exsurgem do íntimo de qualquer ser humano perante temática de tão flagrante barbárie. Trata-se, verdadeiramente, de termo designativo à conduta desconsertada que encontra amplo debate em nossos anais da psicologia e da psiquiatria.
Primeiramente, não obstante, esclarecerei ao leitor que o verdadeiro pedófilo pode nunca haver praticado um crime sexual contra crianças ou adolescentes, bem como alguém que não seja pedófilo pode havê-lo praticado diversas vezes. Ocorre que a noção coloquial que imputa de forma generalizada aos crimes sexuais praticados contra menores como sendo a sua totalidade ocasiões de “pedofilia” é concepção equivocada, porquanto esse tipo de parafilia é termo clínico, não penal.
Perceba-se: pedofilia é também designada por meio dos termos “paedophilia erótica” ou “pedosexualidade”. Esse fenômeno social constitui-se em uma parafilia na qual a atração sexual de um indivíduo adulto está direcionada “primariamente” em relação a crianças pré-púberes ou não. Diz-se “primariamente”, porque, antes de sentir-se atraído por alguém do sexo oposto e com idade similar, o agente vê-se compulsivo por jovens de tenra idade.
Assim, é bem possível que um sujeito seja pedófilo, ou seja, que possua atração “primária” por crianças ou adolescentes, mas que jamais tenha externado isso, conservando referido fenômeno consigo, em seu íntimo, sofrendo, quiçá, pelo seu distúrbio.
Por outro lado, é bem possível que um sujeito que não possua referida doença haja praticado um ou mais crimes sexuais contra crianças ou adolescentes. Isso ocorre, por exemplo, em famílias desajustadas, onde o pai, o que não é raro, na ausência da mãe, abusa sexualmente dos filhos menores, não por ter a doença “pedofilia”, mas por estar embriagado, drogado ou por puro ato de banditismo.
Dito isso tudo, a despeito de ser corriqueiro perceber-se nos meios de comunicação a confusão técnica que se faz em torno do termo “pedofilia” e da ciência de que se tem a respeito de que uma inverdade proferida mil vezes torna-se uma verdade, ao menos aparente, é também sempre de bom tom levar-se à população informações um pouco mais esclarecedoras sobre determinados temas.
* Roger Spode Brutti é Delegado de Polícia Civil, lotado na Delegacia de Pronto Atendimento de Tramandaí (RS), graduado em Direito na Unicruz, formado na Academia de Polícia Civil em 1999, especializado em Direito Penal (Ulbra), Direito Constitucional Aplicado (Unifra), Segurança Pública e Direitos Humanos (FADISMA) e mestrado em Integração Latino-Americana pela UFSM e Ciências Jurídico-Sociais na Universidad Del Museo Social Argentino (UMSA), da Argentina.
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